Tempos de Esquila
Por Mario Garcia
Tempos de Esquila
E já vem chegando o “tempo das esquilas”. A gurizada em polvorosa, o ‘dona da casa e rebanho’, tem que pensar cada detalhe pra quando a comparsa chegar, estar tudo pronto, para iniciar os ‘téque téque’ das tesouras.
Então, prepara a melhor bombacha, aquela ‘de sair’ e se vai ao povoado. Na livreta de apontamento que vai no bolso, vai anotado: Comprar as bolsas de lã, umas quatro ao cinco, o cordão de atar velo, não esquecer do giz marcador(tissa) , pra caso precise marcar, também ‘creolim’ para evitar a bicheira, pois sempre tem alguns beliscões, do bico da tesoura.
E vai também anotadito, o reforço no mantimento, já vai bem avisado, não esquece de ‘pegá os pacote de massa de 5kg’, as bolachas da quebra queixo e também as gajetas, que os pacotes também são bem graúdos, e pega daquelas que vem dos castelhanos. O café, tem que ser 35, já vai avisando a patroa.
E chega o dia, é de tardezinha, a turma da comparsa vai chegando; Uns a pé, de bicicleta, a cavalo e de moto vinham, pois desde o fim de outubro, já estão na estrada, de galpão em galpão, é uns quatro ou cinco dias, e até uma semana, por rebanho. É o Manoelzinho, o Pequeno, o Aroniz, e o Elmedio - que chegava estiloso, de óculos de sombra e manta. O fato, é que todos têm na mala de garupa, a parceira inseparável, a ferramenta de trabalho, a tesoura de esquila, da marca Herval, uma Corneta ou uma solinge. O que era de consenso, a pedra de afiar e sentar o fio da parceira, uma pedra São José, do Herval.
No dia seguinte, todos saltam cedo, lá pelas quatro da manhã, já tão mateando e na sequência tomam café com bolacha, pra logo já iniciar a tosquia. E, assim se inicia o ‘teque teque’ das tesouras, brete cheio, não tinha agarrador, cada um agarra a sua, a ordem era única: não pega da pata. O cancheiro, era o ‘Murchinho’, que entre uma piada e outra, atava e ia formando os velos de lã, e dentre um assovio e uma molecagem, ouvia: Murchinho larga a lata (ficha) e não me enrola. Também, recarrega o mata-bicheira e marca esta, o patrão pediu. Se iam, o dia todo nesse furdunço.
Lá pela nove da manhã, hora do fiambre, carne de ovelha frita com farinha de mandioca e mais ‘uns gole’ de café. Grudavam de novo, iam até a hora da bóia, que sempre era forte, espinhaço de ovelha com canjica, tinha até sobremesa, arroz com leite ou ambrosia.
Já no finalzito da tarde, a largada, limpa a cancha e afia a tesoura numa ‘São José’, depois se iam a sanga, tomar banho, tirar a cera e ajeitar a melena.
No início da noite, a prosa buena com assuntos do dia, regados pelo mate e a canha, uma ‘três galo’ ou a ‘tremapé’, pra limpar a garganta e clarear a fala. Depois da janta, hora de tentar sintonizar o radinho, mas o lamento era um só, só pega os castelhano.
No outro dia, seguiam no mesmo ritmo, mete lata Murcinho. Já no quarto dia, o véio Mário, já estava de embolsador montado, bolsa de lã pendurada. De pronto já grita, manda ‘veo’ guri. Então, ia atirando os velos pra cima, mais ou menos, uns três metros, pra ir embolsando a produção, dependendo do tamanho de cada, cinco na volta e um no meio, essa era a formato para montar a bolsa de lã, empilhando de 6 em 6, formando a bolsa de lã, que chegava a pesar até 250 quilos.
No outro ano, tinha de novo, era um evento, quando chegava a época das esquilas.
A esquila, pela região da fronteira sul, geralmente acontecem entre os meses de outubro, mais para final, novembro, dezembro, encerrando em janeiro. A tosquia da ovelha, além de gerar receita anual para o criador, é necessária para o animal, pois possibilita o alivio da retirada da lã, para passar o verão. Inclusive, evitando a decaída, a diminuição de peso.