Muita históriaMúsica é um dos meios de expressão mais usados para nos representar como habitantes do extremo sul do Brasil. Ela segue se reinventando, se refazendo, acompanhando a mudança ininterrupta do mundo e do nosso viver.A produção musical que tratamos – a música urbana gaúcha – já teve momentos muito importantes ao longo da sua história. Em relação a festivais, Arthur de Faria (compositor e pesquisador) descobriu, por exemplo, um festival da canção em Porto Alegre promovido em 1963, dois anos antes do primeiro evento do gênero em São Paulo, em 1965. Depois vieram festivais como o da Arquitetura da Ufrgs, o da TV Gaúcha e o Musipuc.Também foi criada a Frente Gaúcha de Música Popular, com Cláudio Levitan, Raul Ellwanger e Giba Giba, entre outros. E, influenciados pelo movimento da Tropicália, que despontava nacionalmente, uma nova leva de artistas surgiria, como Carlinhos Hartlieb, Laís Marques e Hermes Aquino.Toda esta diversidade e investimento na música remonta a um ano em especial, 1975, como enfatiza Arthur de Faria: “houve uma primeira explosão em Porto Alegre, quando a rádio Continental passou a gravar e tocar os músicos locais”. No mesmo período, foram realizados os shows Vivendo a Vida de Lee e emergiu o grupo Almôndegas. Nesta época, rock e MPB dividiam os mesmos palcos. "Os anos 1980 é que separam bem: quem é do rock não é da MPB, quem é da MPB não é do regionalismo, e ninguém gosta de ninguém", afirma Faria.Após a criação da gravadora Isaec e o lançamento do disco Paralelo 30 em 1978, toda uma geração de músicos urbanos gravaria pela primeira vez. Até ali, Bebeto Alves, Nei Lisboa, Nelson Coelho de Castro e o musical Saracura (com Nico Nicolaiewsky) tinham suas músicas tocadas em rádio, principalmente na Bandeirantes, e lotavam todos os shows. No entanto, Faria relembra que 1985 viria a ser o marco do rock gaúcho e as rádios praticamente parariam de tocar os músicos que não pertenciam a este gênero musical. A partir da década de 90, ocorreu a intensificação do intercâmbio na região do Prata. Músicos como Marcelo Delacroix, Richard Serraria e Vitor Ramil estreitaram os vínculos com uruguaios e argentinos, como Ana Prada, Daniel Drexler, Dany López e Pablo Grinjot, gravando discos em parceria e circulando entre as capitais platinas. A região tem historicamente um substrato cultural propício para estes intercâmbios, a exemplo da Casa A Electrica, que fabricava discos em Porto Alegre nos anos 1910 e abastecia o mercado de Buenos Aires. Em meio a longas trajetórias, emergiram nos últimos anos dezenas de novos artistas. Após a agitação proporcionada por coletivos como Escuta o Som do Compositor e Autoral Social Clube, por volta de 2013, hoje diversos palcos recebem o lançamento dos primeiros álbuns de uma nova geração, como André Paz, Bibiana Petek, Carmen Corrêa, Daniel Debiagi, Ian Ramil, Leo Aprato, Pablo Lanzoni, Poty, Rafa Costa, Raquel Leão e Thiago Ramil, entre outros.Artistas como Nei Lisboa, Bebeto Alves e Vitor Ramil, que começaram carreiras nos anos 1980, seguem gravando álbuns, realizando shows e mantendo uma relação de fidelidade com os fãs. São artistas que costumam lotar as plateias onde se apresentam.O compositor Leandro Maia observa a relevância da produção independente para a música do Rio Grande do Sul, incluindo música urbana, mas também trabalhos instrumentais como de Renato Borghetti e regionalistas como de Pedro Ortaça. "Todo mundo é pequeno agricultor de música, basicamente indústria familiar, mesmo que exportem para a Áustria, o modo de produção é selfmade man", compara. ...
Música Gaúcha Urbana e suas influências - continuação
E conforme vimos, a música gaúcha sofreu uma influência constante de inúmeras culturas, tanto nacionais como internacionais.
A Música Popular Gaúcha abarca artistas que exploram várias fusões de ritmos, que vão do regional ao “universal”.
Da tendência “regionalista” da MPG, podemos citar, entre outros: Almôndegas (e, em decorrência, seus ex-integrantes, tais como Kleiton e Kledir e Pery Souza), Vitor Ramil, Sérgio Napp, Bebeto Alves, Jerônimo Jardim, Mário Barbará, Raul Ellwanger, Loma, Victor Hugo, Fogaça, Sérgio Rojas, Sérgio Napp, Tambo do Bando.
Da tendência “universal”, temos entre outros: Musical Saracura (com Nico Nicolaiewsky), Nelson Coelho de Castro, Gélson Oliveira, Elaine Geissler, Cláudio Levitan, Fernando Ribeiro/Arnaldo Sisson, Fausto Prado/ Caetano Silveira, Glória Oliveira, Nando Gross, Galileu Arruda, Nando D’ávila, Ângela Jobim, Jorge Foques, Marietti Fialho, Paulo Gaiger, Lúcia Helena, Antônio Villeroy, Geraldo Flach, Susana Maris, Adriana Calcanhotto, Toneco, Zé Caradípia, Sá Brito, Fernando Corona, Opus, Carlinhos Hartlieb, Giba Giba, Léo Ferlauto, Nanci Araújo, Zé Flávio, Adriana Marques, Arthur de Faria, Simone Rasslan, Hique Gomes, Grupo Semente, Marcelo Delacroix, Adriana Deffenti, Flora Almeida, Gisele di Santi.
Da tendência mais “pop”, podemos citar: Papas da Língua, Nei Lisboa, Lúcia Severo, Rafael Brasil, Danni Calixto, Rosa Franco, Jah Mai, Monica Tomasi, Engenheiros do Hawai, Cláudio Vera Cruz, Annie Perec...
Sobre rótulos e formas de produção, o compositor Leandro Maia revela que ainda não sabe bem ao certo qual é a melhor definição para o seu trabalho. "Gosto de cantautor, porque inclui algo próximo a singer-songwriter, aquele que interpreta as suas canções", diz. A forma canção é a que Maia acredita melhor expressar o que faz, e enfatiza que canta do jeito que fala, com sotaque gaúcho, misto do interior e do urbano.
Marcelo Delacroix, cantautor que despontou nos anos 1990, acredita que o público se estabelece na persistência do trabalho. "O artista é aquele que não consegue desistir", diz.
Artistas como Nei Lisboa e Vitor Ramil, que começaram carreiras nos anos 1980, seguem gravando álbuns, realizando shows e mantendo uma relação de fidelidade com os fãs. Já realizaram campanhas exitosas de financiamento coletivo (crowdfunding) e costumam lotar as plateias onde se apresentam.
Em meio a longas trajetórias, emergiram nos últimos anos dezenas de novos artistas. Após a agitação proporcionada por coletivos como Escuta o Som do Compositor e Autoral Social Clube, por volta de 2013, começaram a ocorrer apresentações e o lançamento dos primeiros álbuns de uma nova geração, como André Paz, Bibiana Petek, Carmen Corrêa, Daniel Debiagi, Ian Ramil, Leo Aprato, Pablo Lanzoni, Poty, Rafa Costa, Raquel Leão e Thiago Ramil, Zelito Ramos, João Ortácio, Pedro Borghetti, João Salazar, entre outros.
Arthur de Faria caracteriza essa nova geração como tributária da MPB: "aquela coisa da canção um pouco sofisticada, de letra que fala do cotidiano". Na visão de Delacroix, o jogo teria mudado novamente. "Essa gurizada está fazendo uma música da geração deles; não é mais uma MPB antiga, é diferente; melodias meio lânguidas, letras cheias de imagens, harmonias que vão por uns caminhos mais etéreos; flerta com rock às vezes", afirma.
Um dos nomes da recente movimentação local em torno da canção, Poty não vê uma unidade estética na turma, apesar de tocarem com os mesmos músicos e trabalharem com os mesmos produtores. "Forma-se um elo estético, mas é muito plural a produção", conclui.
Referência bibliográfica: Rogério Ratner e Jornal do Comércio
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A história nos mostra que foram diversas as matrizes culturais que formaram a música dita como típica gaúcha. Esta mistura de influência étnicas e culturais que formam o Rio Grande do Sul, constantemente acrescidas por novas informações trazidas pelos imigrantes, migrantes, visitantes nacionais e estrangeiros, foi lentamente construindo a sonoridade gaúcha.
Portanto, a música gaúcha tradicional está alicerçada em alguns elementos de base que, ao contrário do que se imagina, não estão aqui “desde todo o sempre” e sim foram se formatando lentamente, num processo contínuo de mistura das mais variadas vertentes, de forma a resultarem nos chamados elementos nativos.
A delimitação mais rígida entre música rural e música urbana gaúcha, nem sempre existiu. Considera-se que esta divisão iniciou-se a partir da década de 70, do século XX, tendo como marco a criação da Califórnia da Canção, festival de música realizado na cidade de Uruguaiana/RS. Antes de tal marco, de um modo geral, compositores, instrumentistas e intérpretes gaúchos tanto tinham uma produção de músicas urbanas (sambas, tangos, choros, valsas, etc) como uma produção de músicas com ritmos e temáticas considerados regionais.
Também – dos anos 30 até os 60, do século XX - houve no Rio Grande do Sul uma pujante “Época de Ouro” do rádio, tendo como destaque as rádios Farroupilha, Gaúcha e Difusora, além de muitas outras espalhadas pela capital e interior do Estado. Da mesma forma, algumas rádios do centro do País eram muito ouvidas por aqui. Por isso compositores, instrumentistas e intérpretes sofriam enorme influência da música produzida no centro do Brasil.
Como exemplo temos o Conjunto Farroupilha, grupo vocal que transitava entre a música internacional, a música brasileira urbana e a música tradicionalista gaúcha; e também Lupicínio Rodrigues, que tem sua maior obra musical como sambista, mas escreveu o clássico gaúcho “Amargo”.
A partir do final dos anos 70, do século XX, a música urbana feita no Rio Grande do Sul, passou a ser conhecida como MPG – Música Popular Gaúcha. Esta sigla nem sempre é aceita por músicos do Estado, devido a suas especificidades estilísticas, mas o fato é que a sigla se consagrou (hoje não sendo mais tão utilizada).
Em 1978 o Estúdio ISAEC, de Porto Alegre, adquire equipamentos e lança o selo “Gravadora ISAEC”. No mesmo ano, lança a coletânea Paralelo 30, considerado um marco na música urbana do Rio Grande do Sul. O álbum, produzido pelo jornalista e crítico musical Juarez Fonseca, reuniu seis compositores/intérpretes: Bebeto Alves, Carlinhos Hartlieb, Raul Ellwanger, Claudio Vera Cruz, Nando D’Avila e Nelson Coelho de Castro, cada um com duas composições.
Esse álbum, Paralelo 30, foi o início do desenvolvimento de uma indústria fonográfica em Porto Alegre.
Em setembro de 1982 o produtor Ayrton “Patineti” dos Anjos criou o Festival Música Popular Gaúcha no Teatro São Caetano, RJ. O show foi uma resposta a uma provocação de um produtor carioca que, ao ver um show nativista, perguntou o que mais havia em Porto Alegre. Respondeu Patineti que havia a MPG. E durante cinco noites de shows se apresentaram Carlinhos Hartlieb, Jerônimo Jardim, Bebeto Alves, Nelson Coelho de Castro, Geraldo Flach, Raul Ellwanger, Mauro Kwitko, Pery Sousa, Galileu Arruda e Berenice Azambuja.
O Festival Música Popular Gaúcha teve grande visibilidade e foi responsável por apresentar a MPG ao Brasil, abrindo portas no centro do País para muitos artistas.
Referência bibliográfica: Rogério Ratner
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